Por que a Petrobras vendeu sua principal transportadora de gás para a francesa Engie
- Redação
- 27 de jun.
- 3 min de leitura
A venda da transportadora de gás da Petrobras: o negócio bilionário que abriu o mercado

Em uma das maiores privatizações da história do Brasil, a Petrobras vendeu sua mais valiosa subsidiária de infraestrutura, a TAG. A transportadora de gás da Petrobras foi adquirida em 2019 por um consórcio liderado pela gigante francesa Engie e pelo fundo de pensão canadense CDPQ. A transação, avaliada em US$ 8,6 bilhões, não foi apenas um negócio bilionário, mas um evento que quebrou um monopólio de décadas e deu início a uma nova era para o mercado de gás natural no país.
A venda foi o resultado de uma combinação de fatores: a estratégia da Petrobras de focar na exploração do pré-sal, a pressão do governo para abrir o mercado e uma decisão crucial do Supremo Tribunal Federal. No entanto, a operação deixou um legado complexo e um debate que dura até hoje: a privatização trouxe mais competição e eficiência ou apenas criou um aluguel caro que a própria Petrobras e, no fim, o consumidor, têm que pagar?
A Transportadora Associada de Gás (TAG) era, e continua sendo, a espinha dorsal do sistema de gás brasileiro. No momento da venda, a empresa possuía a maior malha de gasodutos do país, com cerca de 4.500 quilômetros de extensão, atravessando 10 estados do Sudeste e Nordeste. Sua capacidade de transporte era de 75 milhões de metros cúbicos por dia, quase metade de toda a capacidade nacional.
O que tornava a TAG um ativo tão valioso era seu modelo de negócio de baixo risco. A empresa tinha contratos de longo prazo, a maioria com a própria Petrobras, no formato “ship-or-pay”. Isso significa que o cliente é obrigado a pagar pela capacidade de transporte reservada, usando-a ou não. Esse modelo garantia um fluxo de receita estável e previsível, o que atraiu fortemente os investidores estrangeiros.
O desinvestimento foi executado em duas etapas. A primeira e maior fase foi concluída em 13 de junho de 2019, quando a Petrobras vendeu uma participação de 90% na TAG por R$ 33,5 bilhões para o consórcio Engie/CDPQ. Parte desse valor, cerca de R$ 2 bilhões, foi usada para quitar uma dívida que a própria TAG tinha com o BNDES.
A segunda fase ocorreu em 20 de julho de 2020, quando a Petrobras vendeu os 10% restantes para o mesmo grupo, por R$ 1,1 bilhão. Com isso, a estatal saiu completamente do negócio de transporte de gás, abrindo caminho para a consolidação de um operador de infraestrutura independente no mercado.
A venda da TAG foi motivada por um alinhamento de interesses entre a empresa e o governo. Para a Petrobras, o negócio fazia parte de sua estratégia de reduzir seu enorme endividamento e concentrar investimentos na exploração e produção de petróleo e gás em águas profundas, especialmente no pré-sal, onde tem maior vantagem competitiva.
Ao mesmo tempo, o governo federal pressionava pela abertura do mercado de gás através do programa “Novo Mercado de Gás”. O objetivo era quebrar o monopólio da Petrobras para atrair novos investimentos. O CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) formalizou essa pressão ao obrigar a Petrobras, por meio de um acordo (TCC), a vender seus ativos de transporte. O caminho foi selado em junho de 2019, quando o STF decidiu que a venda de subsidiárias de estatais não precisava de aprovação do Congresso, removendo o último obstáculo jurídico.
A venda da transportadora de gás da Petrobras cumpriu seu objetivo principal de quebrar o monopólio. Pela primeira vez, o Brasil passou a ter uma empresa de transporte de gás independente, o que permitiu a entrada de novos produtores e consumidores no mercado. Os novos donos também anunciaram investimentos, como uma parceria com a Origem Energia para criar o primeiro sistema de estocagem de gás do país.
No entanto, a transação gerou uma controvérsia que persiste. Críticos, incluindo o atual Ministro de Minas e Energia, culpam a privatização pelo alto custo do transporte de gás. O argumento é que a Petrobras agora se vê em uma situação paradoxal: ela paga bilhões de reais por ano em “aluguel” para usar os mesmos gasodutos que ela construiu, um custo que, inevitavelmente, impacta o preço final do gás para a indústria e para o consumidor.
Publicado originalmente nos site CPG
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